segunda-feira, 14 de julho de 2008

Que falta faz um livro...

O texto abaixo me fez lembrar de uma conversa que tive com um amigo, assíduo assinante da Playboy, VIP, TRIP e Men´s Health (acho que não me esqueci de nehuma...). Enquanto eu lia a matéria "A sobremesa é você" , fiquei curiosa em saber o porquê dele consumir tais periódicos, além do interesse no óbvio "nu artístico":


- Menino, você não precisa desse tipo de guia. Não existe um mapa, mulher não é tudo igual, não...
- Ah, sei lá... Mas tem mulher que é muito estranha, saca? Aí, a gente fica meio sem saber, pra isso que serve essas matérias.
- Bom, mas se a mulher é muito estranha, ela não seria igual a todas as outras. Então, esse guia não serviria, né?


Ele ficou sem me responder. Até hoje. Não sei se ele continua a assinar as revistas, mas acabou de arranjar uma namorada que, segundo ele: "Tá legal... Pelo menos ela me faz companhia..."


Bem, vamos ao texto:


"O Encontro com o Carrasco


Esta semana, enquanto aguardava por atendimento num consultório médico, acometido pelo tédio profundo do confinamento de uma anti-sala claustrofóbica, me vi naquela triste situação em que beber um copo d´água pode se transformar numa grande aventura. Depois de ter bebido três deles, e de ter ido ao banheiro duas vezes -uma delas apenas para ler os rótulos dos produtos que estavam sobre a pia- finalmente resolvi encarar o cesto de revistas como uma possibilidade de entretenimento.

É impressionante como apenas cinqüenta minutos de chá de cadeira separam um leitor exigente de um voraz consumidor de qualquer publicação impressa. Existe até uma piada (olha elas aí de novo) que afirma que a diferença entre um carrasco e um médico é a idade das revistas disponíveis em sua sala de espera. No meu caso era possível escolher entre publicações semanais de 2006, uma revista voltada para a terceira idade -sem data de edição- e uma outra, daquelas entituladas com nomes próprios femininos, de julho de 2008. Díficil escolher, optei pela mais recente.

A verdade é que já tinha reparado a Cléo Pires sorridente, no topo do cesto, me convidando para uma folheada descompromissada. Resisti o quanto pude, não por preconceito com o gênero, mas sim porque na capa, logo abaixo de seu rosto, havia a chamada para a seguinte matéria, em letras garrafais: “horóscopo da beleza-a maquiagem certa para o seu signo”. Confesso que fiquei com medo de abrir a revista e até reconsiderei me inteirar do mundo dos sexagenários. Que diabos de matéria é essa? Quem lê esse troço? Quem acredita em maquiagem ideal pra cada signo? E não é que os caras conseguiram justificar a existência de um determinado tipo de maquiagem para cada um dos signos? E eu me considerava criativo…

Quanto mais números de páginas avançavam, maior era o desconforto causado pela impressão de estar penetrando em território proíbido. Também em nada ajudou o olhar de reprovação de uma senhora sentada em frente. Parecia uma bastiã do universo feminino, me condenando por profanar o espaço sagrado dos segredinhos da beleza feminina, dos conselhos íntimos, das dúvidas inconfessáveis, dos complexos, dos medos. Todos os temas carinhosamente compliados por experientes editoras e eu ali, xeretando, absorto na falta de sensibilidade comum aos homens, pondo em xeque uma relação de quarenta e sete anos de cumplicidade entre a revista e suas leitoras, ainda mais numa sala de espera.

Vai ver a senhora só ficou com inveja porque eu peguei a revista antes dela. Ou não. Eu quase podia ouvi-la dizer “quem é você para achar alguma coisa sobre a revista? Ela não foi escrita para você, muito menos para ser avaliada numa conjuntura tão desfavorável quanto a que estamos submetidos”. Tá bom, uma segunda chance, a matéria seguinte: “casamento sexy de A a Z”, um dicionário érotico formado por verbetes indispensáveis para apimentar a relação. Letra P, “pênis- seja amiga dele”. Letra X, “xibiu”, (se você não sabe o que significa cuidado com quem for perguntar), Letra Z, “ziguezigue- indica brincadeira de criança, traquinagens e outras travessuras. Nenhum casamento sério pode dispensar ziguezigue”.

Aí a revista me perdeu. Meu lado femino qualificou a publicação como um ultraje a inteligência das mulheres. Não quis mais saber dos cuidados necessários para evitar uma “roubada” nos relacionamentos que começam pela internet, nem procurar aquela sessão de cartas em que as leitoras contam casos escabrosos protegidas por pseudónimos. Voltei à capa, indignado, para descobrir quanto se paga por uma revista destas. Era um exemplar de assinante. Cléo Pires, francamente… você aí sorrindo, não deve ter lido as baboseiras que eu li.Sorri para a senhora e entreguei a revista em suas mãos. “Farte-se”, pensei. Dois minutos e o médico me chamou, o pesadelo havia acabado. Entrei no consultório aliviado, e convicto de que a maioria das revistas masculinas deve ser bem pior do que a que eu acabara de ler."


Páreo duro...


Texto de Bruno Medina do Instante Posterior

Um comentário:

Ana disse...

Páreo duro mesmo... Acho que uma grande diferença entre "as literaturas" voltadas para o público masculino e público feminino é: o homem quer comer a mulher; a mulher quer que o homem se apaixone por ela. Daí vêm esses textos "magníficos" dessas revistas. E no final das contas tudo culmina em sexo, sexo e sexo.

Será que não seria mais interessante ter uma revista National Geographic no consultório?

PS: Música: "You and me, babe, ain't nothing but mammals. So let's do it like they do it on the Discovery Channel..."